Muro de Berlim: queda ou rachadura?
Hist�ria tradicional da Guerra Fria
                             A verdade � cristalina, dependendo da posi��o de incid�ncia da luz, ela muda de cor.

Numa vis�o mais tradicional, a Guerra Fria � o resultado de um processo, que vai maturando-se no decorrer da II Guerra Mundial por�m que tem uma certa altera��o em sua estrutura, culminando em seu colapso.

Antes mesmo dos Estados Unidos entrarem na Guerra, o apoio estadunidense � Inglaterra fez com que os la�os entre eles apertasse, levando � cria��o da Carta do Atl�ntico. Uma das principais delibera��es desse acordo � a de que n�o haveria incrementos territoriais sem o pr�vio consentimento da popula��o local fato que ocorreu na I Guerra Mundial. Com isso j� plantava-se a id�ia da divis�o do mundo atrav�s de influ�ncias e n�o atrav�s da expans�o territorial.

No final deste mesmo ano, diante do ataque japon�s a Pearl Harbour, os Estados Unidos entraram na Guerra. J� no in�cio de 1942, Churchill e Roosevelt fizeram a Declara��o das Na��es Unidas, que constitu�a-se num apelo aos pa�ses livres para unirem-se contra o nazi-fascismo, al�m de seguir, em grande medida, as prerrogativas da Carta do Atl�ntico.

Em 1943 ocorreu a Confer�ncia de Teehran, na qual reuniram-se Churchill, Roosevelt e Stalin. Esse foi o momento decisivo para a cria��o da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU). Tal confer�ncia foi profundamente marcada por tend�ncias que eram percebidas neste momento da Guerra: haviam diverg�ncias de a��o (a Inglaterra queria abrir uma frente no sul da Europa pois vislumbrava o aumento do poderio militar sovi�tico no leste europeu, os Estados Unidos e a Uni�o Sovi�tica preferiram abrir uma frente na Fran�a), mesmo diante destas diverg�ncias, todos eram favor�veis ao desarmamento do Estado alem�o. Neste momento tamb�m discutiu-se a cria��o da ONU.

A Confer�ncia de Yalta (Churchill, Roosevel e Stalin) ocorreu no in�cio de 1945 e foi respons�vel pela divis�o institucionalizada do mundo em zonas de influ�ncia, prevalecendo a l�gica cooperativa entre as grandes pot�ncias. Decidiu-se pela divis�o quadripartite da Alemanha entre os Estados Unidos, a Inglaterra, a Uni�o Sovi�tica e a Fran�a (esta �ltima para assegurar o equil�brio europeu). Neste momento os destinos gerais da guerra j� estavam dados, por�m n�o sabia-se como acabar com ela (ao que tudo indica, somente os militares estadunidenses sabiam da exist�ncia da bomba at�mica e quando o executivo ficou sabendo sobre a exist�ncia desta nova arma, havia uma verta dificuldade para lidar-se com o seu poder potencial, n�o tanto pelo uso em si, todavia pela possibilidade j� vislumbrada de uma poss�vel corrida armamentista com a Uni�o Sovi�tica).

A fim de reduzir os custos humanos, os Estados Unidos pressionaram a Uni�o Sovi�tica para entrar na guerra contra o Jap�o, por�m ela havia assinado um acordo em 1939 de n�o agress�o ao Jap�o. Diante da ina��o efetiva da Uni�o Sovi�tica os Estados Unidos fizeram uso da bomba at�mica.

Foi na Confer�ncia da Potsdam que as contradi��es entre a Uni�o Sovi�tica e os Estados Unidos/Inglaterra foram mais evidentes. Foram assinados tratados de paz com todos os pa�ses aliados aos alem�es na Europa, por�m o mesmo n�o ocorreu com a pr�pria Alemanha. Uma certa instabilidade foi criada uma vez que a Bulg�ria, a Rom�nia, a Pol�nia, a Hungria, a Checoslov�quia, a �ustria, a Alemanha, a Iugosl�via e a Alb�nia n�o sabiam que tipo de regime deveria ser instaurado. O aumento das tens�es entre as pot�ncias intensificou os problemas sociais no interior de pa�ses mais fracos, j� que dependiam, em certa medida, destes pa�ses pot�ncias..

Churchill pronunciou o termo "cortina de ferro" para expressar o que estava ocorrendo no per�odo. Uma s�rie de princ�pios econ�micos que visavam controlar a Alemanha sob a �gide dos Aliados surgiu neste mesmo per�odo. Destruiu-se o Partido Nacional Socialista Alem�o, tendo como conseq��ncia mais profunda a descentraliza��o e democratiza��o da Alemanha; tamb�m decidiu-se que a Alemanha deveria indenizar os pa�ses afetados pela Guerra.

A conclus�o da Guerra criou uma situa��o tal na Europa (centro tradicional da pol�tica mundial), em que ela encontrou-se dividida entre duas esferas de influ�ncia. Foi a necessidade de evitar os objetivos expansionistas dos Estados do bloco oposto que aprofundou a agrega��o dos Estados, assim como a l�gica da forma��o de blocos. As bases de integra��o de cada bloco fundam-se na coopera��o econ�mica e na prote��o militar. Do lado ocidental, destacam-se Plano Marshal e a Organiza��o do Atl�ntico Norte (OTAN), do oriental o Cominform e os acordos bilaterais entre a Uni�o Sovi�tica e Estados da Europa Oriental.

Neste momento surge a id�ia da dissuas�o, que consiste na amea�a concreta de guerra at�mica, gerando uma situa��o de equil�brio nas rela��es entre os detentores de armas at�micas. Tais pot�ncias viram-se for�adas a evitar confrontos diretos para n�o precisarem recorrer a estes armamentos.

Foi no interior da ONU que os elementos da Guerra Fria puderam expressar-se mais claramente.. Destacam-se as quest�es relacionadas com a Alemanha, com os tratados de paz, das quest�es coloniais e do desarmamento, ainda que neste caso o assunto tenha sido realmente tratado em discuss�es paralelas.

O Plano Marshal � a consolida��o das Guerra Fria j� que � o resultado das tens�es europ�ias e internacionais. A Europa era importante pois constitu�a o centro tradicional da pol�tica mundial como j� foi citado anteriormente e porque nela estava decidindo-se o caminho do mundo, isso porque os problemas pol�ticas europeus estavam tendendo ao militar e ao social. Os Estados Unidos viram-se for�ados a reconstruir economico-socialmente a Europa a fim de garantir a hegemonia liberal burguesa. A Uni�o Sovi�tica foi convidada a participar do Plano por�m recusou-se devido � ajuda que seria oferecida � Alemanha, com isso a reconstru��o econ�mica passou a existir sobre dois eixos, um capitalista e um comunista.

Em resposta �s novas formas de organiza��o na Europa Ocidental, surgiu em 1947 uma organiza��o de partidos comunistas da Europa (Cominforme).

A OTAN tinha por fun��o contrapor-se ao poderia sovi�tico na Europa por�m n�o funcionava como o mais tarde criado Cominform (alian�as bilaterais, dando a base militar do sistema sovi�tico).

Alguns te�ricos das rela��es internacionais ajudam-nos a entender a Guerra Fria, apontando para a estrutura do sistema internacional ou do pr�prio Estado.

De acordo com Morgenthau, os interesses dos Estados s�o definidos em termos de poder e a busca desses interesses impedem os Estados de fixarem la�os de fidelidade com outros pa�ses. Da� decorre que os relacionamentos s�o cooperativos ou competitivos de acordo com a balan�a de poder. A redu��o do n�mero de pot�ncias na Guerra Fria tornou dif�cil o manuseamento da balan�a de poder, j� que torna as rela��es est�ticas. A concentra��o de poder nas duas pot�ncia acabou com a possibilidade de poder forte o suficiente para contrapor-se �s pot�ncias. Ainda que inflex�vel, a bipolaridade tenderia a ceder � multipolaridade j� que havia pa�ses como a Fran�a e a China que colocavam-se contr�rios �s pot�ncias de seus respectivos blocos.

Os conflitos do p�s-guerra mostram qu�o fr�gil era a paz mundial no momento da Guerra Fria. A ordem e a paz mundiais s�o o resultado da balan�a de poder. Dentro das �rbitas de cada lado do sistema bipolar poderia haver uma certa mobilidade desde que ela n�o rompesse com a l�gica sist�mica. Esse sistema bipolar poderia consolidar-se ou fragmentar-se em v�rios pequenos centros, parece que isso n�o ocorreu, o que demonstraria uma certa dificuldade do realismo de Morgenthau em apresentar explica��es para os desdobramentos da Guerra Fria.

De acordo com Waltz, o que ocorreu na Guerra Fria foi que houve coaliz�es de pot�ncias que destru�ram uma outra pot�ncia, no caso a Alemanha (momento fundante) e com isso alterou-se a estrutura do sistema para um sistema bipolar. A divis�o bipolar do mundo foi acentuada, por parte dos Estados Unidos, pela exagera��o da amea�a sovi�tica e pela demonstra��o de que eles poderia agir em benef�cio dos interesses dos outros povos. Os Estados Unidos n�o queriam expandir-se pelo mundo, buscavam a manuten��o do equil�brio. Waltz aponta que a bipolaridade militar confere estabilidade ao sistema, permitindo a manuten��o da estrutura encontrada na Guerra Fria.

Aron, por sua vez, acredita que o sistema internacional � constitu�do por unidades pol�ticas com rela��es regulares e que podem iniciar uma guerra geral. N�o s� as rela��es de for�as determinam o comportamento externo dos Estados, � importante destacar as id�ias e os sentimentos; com isso os sistemas podem ser homog�neos ou heterog�neos. A Guerra Fria � caracterizada pela id�ia de capitalismo e comunismo, assim como pelos valores que dessas id�ias adv�m.

 

O fim da Guerra Fria (?)

No per�odo tradicional da Guerra Fria, toda a confronta��o entre o Leste e o Oeste seguia uma l�gica pr�pria, que expressava-se nas media��es de for�as em conflitos localizados. Com o fim da Guerra Fria esperava-se o fim deste tipo de conflito localizado, por�m isso n�o ocorreu demonstrando que nem todos os princ�pios que vigeram na Guerra Fira hoje deixaria de existir.

Por outro lado, algumas mudan�as podem ser percebidas hoje. A mais aparente � o fim do confronto Leste-Oeste, ao menos da forma como deu-se, os conflitos atuais est�o pulverizados pelo globo e, excetuando-se conflitos mais tradicionais, n�o parecem recorrer � guerra com tanta facilidade.

Ao apontar para o fim da Guerra Fria, o foco de aten��o est� direcionado principalmente para o confronto entre os Estados Unidos e ex-Uni�o Sovi�tica; parece esquecer-se que o confronto deu-se entre id�ias (ligadas ao capitalismo e ao comunismo) e que materializavam-se na paisagem geogr�fica, tendo os Estados Unidos e a ex-URSS como epicentros de representa��o. O fortalecimento militar seguia a l�gica de enfraquecimento (ou n�o fortalecimento) relativo do campo advers�rio afim de que as id�ias e valores dele n�o alcan�assem uma repercuss�o ainda maior. A busca pelo fortalecimento militar n�o acabou com o fim da Guerra Fria, o que aconteceu foi que ele pulverizou-se pelo globo; de forma que pode-se perceber que a base militar para a expans�o de id�ias e valores continua viva, ou seja, os confrontos de id�ias e valores continua presente na atualidade e, assim como no tradicional per�odo da Guerra Fria, ele continua a apresentar suas conseq��ncias em outras partes que n�o est�o diretamente envolvidas (com exce��es). Esse � o caso da Iugosl�via, cuja l�gica do conflito obedece � problemas estruturais internos ao que sobrou da federa��o, por�m que tamb�m � o resultado de uma luta de poder entre grandes pot�ncias (Cintra: 1997).

Ainda assim, a atualidade apresenta algumas inova��es com rela��o ao que aconteceu no per�odo pr�-1989. Os Estados, por exemplo, est�o vendo-se cada vez mais integrados (especialmente no campo econ�mico) gerando uma maior interdepend�ncia entre eles. Por um lado h� um forte crescimento da l�gica neoliberal (lei de mercado), contudo tamb�m h� outra l�gica (defendida por pa�ses como a Inglaterra e a Fran�a), em que predominam uma maior participa��o e a solidariedade. O aumento da internacionaliza��o da economia produz uma certa altera��o da estrutura do poder do sistema de Estados.

Segundo pensadores neoliberais, a atual ordem internacional estaria baseada na globaliza��o do capital em suas diversas express�es que tenderia a solapar a exist�ncia de institui��es pol�ticas e formas nacionais; seria atrav�s da hegemonia da economia de mercado e da democracia liberal que os Estados-nacionais e os organismos internacionais ver-se-iam deslocados no tempo, portanto descart�veis na atualidade. Com isso elementos cl�ssicos das rela��es internacionais, como o balan�o de poder e a soberania deixariam de ter import�ncia.

Tal posi��o � refutada pelos marxistas que acreditam que vivemos hoje apenas mais uma fase do capitalismo, caracterizada pela acumula��o e centraliza��o do capital.

H� ainda um outro grupo que entende a atualidade analisando a concentra��o da import�ncia do com�rcio internacional na Tr�ade (EUA/EU/Jap�o), oferecendo a estas pot�ncias com especial destaque aos Estados Unidos uma grande capacidade de pressionar os mercados financeiros e outras atividades econ�micas, controlando-as. N�o por menos, a ONU est� tornando-se menos importante (neste sentido) e a Organiza��o Mundial do Com�rcio (OMC) passa a ser, qui��, a mais importante organiza��o internacional da atualidade.

J� os autores realistas (e, em parte, neorealistas) acreditam que os fundamentos b�sicos do sistema internacional continua o mesmo. Para eles o sistema continua marcado pela busca pelo poder, ou seja, competitivo e conflituoso. O fim da Guerra Fria significaria uma altera��o na distribui��o de capabilities entre os Estados, por�m ela n�o teria alterado estruturalmente o sistema, ou seja, o poder relativo, a sobreviv�ncia do Estado e a seguran�a continuariam a ser as principais influenciadoras nas a��es dos Estados. Neste sentido, organiza��es internacionais n�o t�m a efici�ncia necess�ria para acabar com a anarquia internacional j� que a id�ia da balan�a de poder continua viva ("o amigo de hoje pode ser o inimigo de amanh�"); os relacionamentos entre os Estados continua a dar-se em torno de interesses moment�neos, baseados no grande interesse permanente que � a busca do poder.

A coopera��o s� � poss�vel se n�o desequilibrar o sistema, portanto s� ocorre no momento em que todos ganham proporcionalmente igual. O campo realista continua afirmando que os Estados s�o os principais atores das rela��es internacionais e s� os Estados, ao procurarem manter seu poder relativo, podem promover formas cooperativas, hegem�nicas ou de equil�brio.

Ainda que existam autores que defendam a primazia da economia sobre a pol�tica, esta continua a existir e � expressada pelos interesses dos grupos (de indiv�duos ou pa�ses) e suas respectivas capabilities para fazerem valer suas demandas.

Diante do aparente fim da Guerra Fria, coloca��es que antes estavam abafadas puderam ser colocadas uma vez que as coisas n�o mais precisavam ser colocadas em fun��o do comunismo ou do capitalismo. Na Guerra Fria, a heterogeneidade que compunha cada bloco viu-se for�ada a buscar pontos que gerassem uma homogeneidade para maximizar as capabilities frente ao outro bloco (� como se, apesar das diferen�as entre um ga�cho, um paulista e um amazonense, todos precisassem recorrer � id�ia de brasileiro para lutar contra um inimigo externo ao Brasil). A partir do momento em que a necessidade de supress�o da heterogeneidade em prol do fortalecimento do bloco deixa de existir, as diferen�as de id�ias podem aparecer no interior do pr�prio bloco, gerando um novo confronto entre id�ias e valores (a particularidade deste novo confronto � que ele d�-se sob uma base comum m�nima de valores e id�ias semelhantes).

O per�odo da Guerra Fria, era simplista (pois simplificava a heterogeneidade) e por isso tornou-se o sistema est�tico que os realistas pregavam. Grande parte da dificuldade que os realistas t�m atualmente em entender o fim da Guerra Fria e o contexto internacional atual adv�m da id�ia de um Estado racional que busca a maximiza��o de seu poder.

Com a aparente crise do sistema comunista, h� a preval�ncia do capitalista. Contudo, ainda que haja uma base m�nima comum, h� grandes diferen�as nas formas de capitalismo, tanto no n�vel internacional (com especial destaque para o estadunidense, o europeu e o japon�s) e no n�vel nacional (classes trabalhadoras e corpora��es multinacionais). Desta forma, o Estado � uma s�ntese desses jogos de poder que ocorrem no seu interior, na sociedade, podendo alterar a sua atua��o internacional superficial (a base de sua atua��o continua sendo a defesa do sistema capitalista como um todo).

Como Keohane aponta (Keohane: 1996. P.247), "relative prices changes generated by internationalization alter the behavior of economic agents such as firms in the face of existing policies, undermining their value to the government. Hence, the government may change its policies even without direct pressure from social groups". A pr�pria racionalidade de a��o do Estado est� fortemente influenciada pela multiplicidade de agentes internos frente �s suas respectivas interpreta��es do contexto internacional. Al�m disso, o Estado pode defender v�rias posi��es diferentes (at� mesmo contradit�rias) a fim de satisfazer a demanda dos grupos de interesse que o forma. Desta arte, se, por uma lado, n�o podemos sobrevalorizar a import�ncia do grupo econ�mico (ver Krugman: 1997), por outro n�o podemos descartar completamente este campo. Se, durante a Guerra Fria, a ideologia encontrava uma certa predomin�ncia sobre os demais campos, hoje parece haver um relacionamento mais igual entre esses campos (mesmo porque o papel que a ideologia desempenhava enfraqueceu-se j� que universalizou-se: critica-se o tipo de capitalismo por�m n�o o capitalismo em si mesmo).

A id�ia de colapso da Guerra Fria vem a confirmar a id�ia neorealista de que a coopera��o � poss�vel quando um Estado mais poderoso lan�a as regras e ajuda em sua implementa��o. Um bom exemplo disto foi a atua��o do presidente Bill Clinton na �ltima reuni�o da OMC (1998), na qual lan�ou suas id�ias antes da reuni�o dos chefes de Estado, disseminando-a e depois valendo-se do apoio dos outros Estados e da organiza��o para implementar suas demandas.

A vis�o realista Estado-c�ntrica s� encontrou grande for�a no per�odo da Guerra Fria, pois neste momento ocorreu uma certa confus�o entre o bloco capitalista/ocidental com os Estados Unidos por um lado, e o bloco comunista/oriental do outro. Esses dois pa�ses pot�ncias detinham um poder muito maior do que qualquer coaliz�o de pa�ses terceiros, contudo eles tamb�m baseavam-se nos demais, de forma que o confronto era entre blocos de pa�ses controlados por pot�ncias e n�o entre essas.

Atualmente algumas barreiras entre as pol�ticas nacional e externa est�o erodindo-se, criando mudan�as na id�ia de soberania. Est� sendo criado um mundo multic�ntrico, no qual os atores colocam-se acima da soberania tradicional (ainda que marcados, conseguem burl�-la em alguns pontos). Tais atores valer-se-iam da recusa de coopera��o ou cumprimento de acordos, ao contr�rio do tradicional uso da for�a armada (ver Rosenau: 1990). Com isso os Estado passariam a dividir as rela��es internacionais com outros atores que s�o n�o-Estados.

 

Teoria e o "fim" da Guerra Fria

No Realismo, os Estados s�o entendidos como entidades pol�ticas racionais que possuem como fim e meio a busca pelo poder. Uma grande import�ncia � dada ao equil�brio de poder, diante disto tem-se que qualquer coopera��o somente ser� poss�vel se os ganho forem proporcionais � import�ncia dos Estados envolvido, de forma que n�o altere-se o equil�brio pr�vio.

Uma vez que os Estados buscam a maximiza��o de seus poderes, eles s�o protecionistas, levando-os a evitar a depend�ncia em fun��es vitais para com outros Estados. Essa busca de independ�ncia leva � um grande crescimento do Estado, o que poderia causar a guerra. O sistema tende a ser est�vel no momento em que algum Estado torna-se hegem�nico j� que os demais Estados n�o colocar-se-�o contra ele. Outra importante coloca��o do realismo � a de que as rela��es internacionais s�o an�rquicas, caracterizado pela eterna luta pela primazia (tais caracter�sticas viriam da pr�pria natureza humana).

Com rela��o � abordagem realista, algumas pontua��es devem ser colocadas. Ao entender o Estado como um agente racional, descartando o jogo de poder interior (dentro da l�gica Estado-c�ntrica), h� o ‘descarte’ de importantes influenciadores da pol�tica externa dos Estados, que nem sempre � desenvolvida de uma forma homog�nea e racional, ela pode estar respondendo � diferentes demandas (ainda que isso implique, por vezes, numa atua��o antag�nica). Um exemplo disto � a quest�o do meio ambiente no Brasil, na qual o governo ratifica uma s�rie de acordos internacionais sobre a prote��o e conserva��o do meio ambiente por�m, devido � press�es internas, n�o consegue fazer valer-se.

A coopera��o realista, ao exigir a manuten��o do equil�brio encontra dificuldades para explicar situa��es onde isso n�o ocorre. Algumas vezes a coopera��o pode dar-se em fun��o do sistema e n�o necessariamente do equil�brio. Percebe-se uma diminui��o relativa do poder dos Estados Unidos nos �ltimos anos, ainda assim continuam a cooperar (como ocorreu com o recente empr�stimo oferecido ao Jap�o para que esse pudesse controlar melhor a crise) pois isso permite a manuten��o do sistema.

Tamb�m para o realismo, o sistema passa a ser est�vel no momento em que um Estado torna-se hegem�nico; o sistema pode adquirir uma certa estabilidade no momento em que alguns valores passam a ser hegem�nicos; como � o caso do capitalismo hoje: as guerras s�o locais e geralmente ocorrem em locais no qual a l�gica ocidental do capitalismo ainda n�o est� bem sedimentada ou quando h� uma diferen�a �tnico-religiosa muito acentuada (ao menos guerra no sentido mais tradicional do termo).

Acredito que as rela��es internacionais s�o an�rquicas por�m obedecem a uma certa hierarquia. Essa hierarquia � de valores, caso contr�rio os Estados Unidos n�o teriam conseguido a aceita��o e apoio que conseguiram ao propor a invas�o do Iraque, rompendo com o sentido cl�ssico de soberania. Outro ponto � que, ao basear-se na natureza humana, o realismo passa a ser mais dogm�tico j� que a discuss�o do que vem a ser a natureza humana ainda n�o est� acabada.

O liberalismo, por sua vez, entende que os Estados possuem diferentes fun��es, n�o podendo ser classificados de acordo com o poder. A interdepend�ncia � uma maneira de fortalecer os Estados que comp�em o bloco, j� que reconhece-se que a auto-sufici�ncia leva � uma menor efici�ncia. Desta forma, previne-se poss�veis conflitos. Para que a coopera��o mantenha-se, � preciso que todas as partes ganhem, ainda que n�o proporcionalmente � sua import�ncia.

Ao trabalhar com autores heterog�neos, o liberalismo tem uma maior facilidade para entender mudan�as na estrutura, uma vez que o desenvolvimento traz mudan�as, prejudicando alguns Estados, por�m privilegiando outros.

Nem sempre o incremento de novos fatores serve para maximizar o poder, em alguns momentos ele pode apenas estar satisfazendo demandas internas ou promovendo a manuten��o do sistema.

Hoje a economia possui uma import�ncia declarada muito maior do que no per�odo da Guerra Fria, ainda que esteja ligada � id�ia do poder.

Diante de aspectos econ�micos, o Estado sofre interfer�ncias dos movimentos sociais, reafirmando-se constantemente, o que muda os seus relacionamentos com outros Estados. A ordem internacional (Gilpin) � o reflexo da distribui��o de capabilities materiais entre os Estados, oferecendo uma maior din�mica ao sistema. Uma ordem internacional mais duradoura s� � poss�vel se houver o Estado, que desempenha um papel fundamental.

O crescimento da import�ncia de organismos internacionais (com especial destaque para a OMC), demonstra uma institucionaliza��o das formas cooperativo-competitivas. OU seja, n�o h� o prevalecimento do pensamento realista nem do liberal. Na verdade ocorre um pouco de cada. Faz-se importante notar que uma teoria n�o � a descri��o da realidade, todavia um objeto para ajudar a entend�-la. Desta arte, faz-se v�lido usar das teorias dispon�veis, ao mesmo tempo, para tentar descrever a realidade. O realismo trouxe a id�ia de rela��es de poder enquanto que o liberalismo a id�ia de coopera��o; no momento atual as duas l�gicas interagem e s�o dependentes.

Rodrigo Cintra

 

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